Lapinha da Serra - MG - Junho/2010

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Partilhando esse momento...

Como pode essa chuva tão forte, tão bonita e eu aqui trancada num apartamento?
Como pode?
Mas aqui na cidade parece que a gente está mais segura das brabezas dela, que na fazenda.
Tem apara raio, hospital pro caso de acidente dela vindo, mais gente por perto tudo junto...
Arrebenta nas paredes, insiste nas janelas, esfrega-se e se avoluma no asfalto...
Os carros gritam suas buzinas, as gentes xingam engarrafadas, as sirenes lambuzam estridente, a tarde.
Chuva de perto longe. De uns modo de medo.
Lá na minha terra, parece que ela é mais de perto pertinha.
Se chega quase entrante na casa, visita sem precisão de convite.
Outros modos de medo. Reverência. Mandação de suspense: “Ó chuva! Sabedeira de si! Mandadeira da vida! Seja sempre chegante...”.
Não se encrenca com quem é a chuva, desse mandamento sabíamos.
Temporal como esse que aqui despenca, era certo: morte de algum gado, subidas das águas do Cochá, perda de qualquer plantação, benzessão pra chuva acalmar e nada de ruim dela vir, gente que havia de ter morrido de raio... (Tio Mundico quase foi, a sorte foi terem tirado a cadeira que ele tava sentado justo um tempinho antes do raio cair, a parede rachou, ficou lá pra quem quisesse ver a sorte dele escapulido de morrer partido de raio... mas uma prima nossa de seis anos o raio levou... tava sentada na bacia banhando com uma irmã e um irmão pra aproveitar a água de uma só leva de lavagem. Ela foi, a irmã gêmea e o irmão ficaram. Eram dois periquitos na gaiola, um foi, o outro enviuvou. Ninguém nunca que soube explicar daquele mistério. “Vai ver era a vez dela, quando é a vez da pessoa...”, dizia os parentes no velório. Aquilo que chega enchia o peito da gente de tanto medo da força da morte do raio... “Vai voltar, quem sabe vem buscar a outra...”.  Pronto, era pra não dormir mesmo. Ficava dias encabulada com aquela espera anunciada de acontecer tragédia. E a chuva encarregada de raios e trovões crescia de mistério que a gente não dominava de saber...).
Ela não vinha desavisada, mandava recado de suas bravuras pelo céu, pelas nuvens, pelos bichos, pelo vento... eles andavam antes pra dizer de sua chegada.
E os mais velhos liam os recados dela pra nós.
Recomendação. Era hora de se guardar em casa.
Momento dela, gente não se põe.

Numa tardezinha de 31 de março de uma Belo Horizonte encharcada d´água, no ano de 2011 de nosso senhor Jesus.

Malba Tahan Barbosa, pensante de chuva...

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Tenha sempre em mente que a sua verdade não é verdade de todos. Por favor, faça seu comentário respeitando os outros leitores. Obrigada por participar!!