Lapinha da Serra - MG - Junho/2010

segunda-feira, 22 de março de 2010

Centro Administrativo Tancredo Neves

Fernando Serapião - Especial para a Folha
Na gravura "O quarto do arquiteto", de Lina Bo Bardi, a arquiteta do Masp criou uma cena com armário entreaberto, mesa com cadeira e uma prateleira. Os personagens são maquetes de edifícios em diferentes estilos. Uma possível interpretação irônica da obra é que os arquitetos possuem soluções guardadas nas gavetas e as utilizam conforme a necessidade. Lembro-me disso diante da nova obra de Oscar Niemeyer.
A Cidade Administrativa Presidente Tancredo Neves é composta por cinco edifícios, encomendados pelo governador Aécio Neves para reunir no extremo norte de Belo Horizonte mais de 40 órgãos estaduais. São três motivos alegados: induzir o desenvolvimento da região, diminuir despesas (principalmente aluguéis) e facilitar a gestão com a convivência entre funcionários. À primeira vista, principalmente se observado por dentro, tudo é uma maravilha: os móveis são novos, os equipamentos, sofisticados, e os espaços, confortáveis -como nas melhores empresas privadas.
Contudo, do ponto de vista arquitetônico não há novidade. O prédio mais imponente abriga o gabinete do governador. É um edifício envidraçado de quatro andares que fica pendurado por estrutura externa. Com  mais graça, tal solução foi utilizada por Niemeyer há 4 anos para uma editora na Itália.
Louvando o novo prédio, o arquiteto e o calculista afirmam que ele é "o maior edifício suspenso do mundo". E daí? Eles se vangloriam como se o ineditismo técnico fosse de suma importância para o futuro da humanidade.
Gastando energia em retórica desgastada, Niemeyer deixa de lado questões atuais como a eficiência energética - o complexo tem a maior área de vidros da América latina. Fachadas envidraçadas voltadas para as faces ensolaradas, por exemplo, é um erro primário que exigirá mais energia do ar-condicionado. Os dois edifícios maiores são destinados às secretarias. Gêmeos, eles são gigantescos e curvos - e também foram retirados das 'gavetas' do arquiteto. Eles têm proporção semelhante de um hotel em Petrópolis, desenhado em 1950. Por fim, além de um auditório pouco gracioso, o conjunto é completo por um centro de convivência, com restaurantes e lojas, que pretende substituir a rua - o espaço primordial de convivência urbana. E é justamente aí que está o maior problema. Se a arquitetura é requentada, a ideia de pensar em centro administrativo longínquo é tão nova quanto o bonde. Urbanisticamente, é um desastre. O governo deveria permoanecer na região central, renovando edifícios subutilizados e incrementando a vida urbana. ao deixar os edifícios da Liberdade para atividades culturais, serão empobrecidos o uso e a diversidade local.
Se na era da revolução das telecomunicações é estranho falar da necessidade do contato físico, para ajudar a desenvolver a periferia seria mais útil financiar transporte coletivo de massa. Claro, daria mais trabalho e menor visibilidade.
Infelizmente, há 50 anos os políticos acreditam na mística de perpetuar-se com um postal de Niemeyer a fim de repetir a trajetória daquele que encomendou Pampulha e Brasília (raríssimos são os que apostam na capacidade arquitetônica de sua própria geração). Aécio Neves cometeu o mesmo erro: mirando o futuro, ele acertou no passado.
FERNANDO SERAPIÃO é arquiteto e editor executivo da revista "Projeto Design".
 E aí está o projeto do Centro Administrativo Tancredo Neves, que foi inaugurado no dia 04 de março de 2010. Uma obra faraônica, que despendeu uma verba fenomenal, enquanto os milhares de moradores de rua de BH continuam exatamente 'nas ruas', pois não existem verbas para abrigar de maneira digna essa população. Ainda existe a questão da especulção imobiliária, a região que era tratada como periferia e ocupada por cidadãos de baixa renda, está vendo seu espaço ser reorganizado e ressignificado, enquanto tais moradoes são expulsos para locais ainda mais longe do centro de BH, de seus empregos, escolas e etc.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Tenha sempre em mente que a sua verdade não é verdade de todos. Por favor, faça seu comentário respeitando os outros leitores. Obrigada por participar!!